Turismo e Indicação Geográfica do Bordado de Caicó: convergências a partir do olhar de Design

Partimos da ideia central de que produtos&serviços de Indicação Geográfica podem estimular, fortalecer e inovar o turismo de um determinado território. E o contrário também, quando o turismo reconhece e valoriza produtos locais ajuda a potencializar uma futura IG. Assim, na perspectiva de Design como conexão entre atores, de identificar potencialidades e oportunidades e de tangibilizar as ideias, gostaríamos de apresentar sobre a nossa experiência que integrou Turismo e a Indicação Geográfica do Bordado de Caicó.

Primeiramente, vamos pontuar algumas ideias centrais destes conceitos. Turismo é uma atividade econômica caracterizada pelo deslocamento voluntário de pessoas para fora do seu local de moradia e trabalho, isto é, onde adquire sua renda. As motivações são as mais diversas, desde relacionadas à trabalho, estudo, lazer, entre outras. Isso não significa uma uniformidade da experiência. Estudos mostram que os turistas vivenciam e consomem produtos e serviços variados, além daqueles diretamente relacionados à motivação principal da viagem. É o famoso, “já que estou aqui, porque não conhecer…”. Não é?

A Indicação Geográfica é essencialmente a proteção de um nome geográfico associado a um produto ou serviço através da solicitação e registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI. Entre outras exigências, a proteção se dá por causa da história, da tradição, do modo de fazer, do estilo de vida dos indivíduos e das singularidades do produto. Enfim, uma cultura viva! E isso tudo representa um ativo precioso para o território que deseja se desenvolver também através do turismo, pois gera interesse, reconhecimento e demanda de visitantes.

Uma das principais referências de entrelaçamento entre IG e turismo no Brasil é o Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul. O turismo teve um importante crescimento de demanda nesta região a partir do reconhecimento da Indicação Geográfica Vale dos Vinhedos.

Região do Seridó/RN e o seu patrimônio

O Seridó, no Rio Grande do Norte, é um local que produz diversas preciosidades que se tornaram produtos tradicionais da região, como: os queijos de coalho e manteiga, a carne de sol e o Bordado de Caicó, produto com Indicação Geográfica reconhecida. Tem ainda a importante Festa de Santana que acontece em Caicó e está registrada como Patrimônio Cultural Imaterial brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN.

Durante as festividades de Santana, considerada a padroeira da cidade pela religião católica, o fluxo de turistas é muito expressivo e movimenta a atividade econômica. Este período é também o principal período de comercialização do Bordado de Caicó, que aproveita para realizar uma grande feira. A produção do Bordado ativa uma rede de quase duzentas bordadeiras, costureiras, lavadeiras, entre outras especializações do processo produtivo. Caicó é também a cidade polo regional e recebe durante todo o ano, principalmente, turistas de negócios.

O território da IG Caicó é formado por doze municípios. Este grupo foi definido a partir da constatação de que as bordadeiras de todos eles, ao comercializar seus produtos fora da região, trazem como referência o Bordado de Caicó. Esta é uma das evidências de que o nome geográfico valoriza o produto, ajuda a vender e reforça a ideia de autenticidade.

O Bordado como produto associado ao Turismo

O turismo tende a se desenvolver melhor quando um conjunto de opções/atrativos compõe o cenário do território. Mesmo com uma variedade de potenciais atrativos ou de produtos típicos, nota-se que alguns não estão formatados adequadamente para se inserir no circuito turístico, seja por carência de infraestrutura, perenidade, serviços associados ou carência de informações claras. Logo, ao estruturar novos produtos turísticos é necessário considerar alguns destes desafios e definir estratégias factíveis. 

Acreditando no potencial do Bordado como produto associado ao turismo, o Sebrae/RN chamou a Refazenda Estúdio de Design para desenvolver um projeto de turismo de experiência no Seridó. A etapa de levantamento de informações e de reconhecimento da dinâmica local pôde ser rápida pois já vínhamos realizando outros trabalhos junto ao bordado na região. Sempre que estivemos na região, fomos turistas também e diversas situações que observamos ou vivenciamos, colaboraram para alguns insights.

O processo

O primeiro momento foi de estudo dos referenciais do turismo de experiência, de casos e de levantamento das informações turísticas da região.  

Na sequência foi feito um chamado-convite nos 12 municípios para empreendimentos interessados no tema. A maioria das bordadeiras trabalham em casa e algumas poucas possuem loja própria. Há também as lojas de associações e cooperativas. Mesmo não havendo restrições, foi justamente este público que aderiu ao projeto, especialmente motivadas por ganhar mais visibilidade e clientes.

Tínhamos a compreensão de que não bastava ter uma loja, mas sim criar um novo atrativo através de um serviço, especialmente para turistas, que proporcionasse outras vivências e novas experiências. Realizamos reuniões para apresentar e debater estes aspectos e na sequências iniciamos os processos de cocriação.

Um aspecto interessante é que o processo de criação foi também um momento de análise crítica sobre as práticas atuais destas lojas e bordadeiras em geral. Ao compreender os argumentos sobre vir a ser um espaço de vivência, especialmente considerando os comportamentos de consumo das pessoas, compreendiam também as atuais limitações. Junto ao processo de geração de ideias, fazíamos avaliações da infraestrutura, das aptidões das pessoas e dos interesses comuns. Esta etapa se encerrou com a definição do novo serviço de cada empreendimento e o nome que seria usado na comunicação.

Este conjunto de informações foram analisas e elaboramos um plano de trabalho para cada empreendimento para orientar as principais ações e prioridades a serem executadas. Todos os planos tinham em comum a realização de uma prototipagem, isto é a realização de pilotos do serviço.

Rota a ser posta a prova | prototipagem

O primeiro grupo da Rota Linhas, cores e encantos da região do Bordado de Caicó contou com 6 atrativos. Em cada um, uma experiência diferente, como oficinas de bordado manual, oficina de risco, visita guiada no processo produtivo e também opções que agregam a gastronomia, como o bordado com café do Seridó e uma pequena biblioteca de acervo documental da história do Bordado na região.

Neste primeiro momento a principal meta foi de realizar os pilotos, fazer as adequações e aprender estas novas dinâmicas de recepcionar turistas e realizar atividades estruturadas. Para a comunicação foi desenvolvido um catálogo que apresenta os empreendimentos, seus serviços e demais informações de funcionamento. Além disso, o catálogo agrega informações sobre o entorno de cada empreendimento, sugerindo locais para visitação e trazendo outras referências sobre a localidade. Parte deste conteúdo está disponível também no site https://www.encantosdorn.com.br/roteiro/rota-do-bordado-de-caico

Um desafio de design

Foi o modo como encaramos, pois entendíamos que trabalhar dentro dos parâmetros do possível era algo importante. Quais eram eles?

  • Um produto turismo operando redondinho não se cria da noite para o dia. Principalmente se quem ofertará ainda não tem a experiência de atuar no setor;
  • A premissa inicial formatar a rota a partir do mapeamento das bordadeiras que já estavam inseridas no contexto do turismo não se confirmou, pois não identificamos iniciativas com estas características;
  • O prazo, sempre ele! Tínhamos pouco meses para dar uma cara à Rota Turística do Bordado, por isso a estratégia principal do projeto foi de avançar até a etapa de prototipagem.

Assim, o processo de design foi importante para contribuir na visualização dos elementos que compõem o novo serviço, permitindo a compreensão dos aspectos chaves para sua realização, como: adequação do espaço físico, roteiro de atendimento, recursos necessários e pessoas. Destas, a preparação dos ambientes era o que mais demandava tempo e investimento para alguns atrativos. Logo, o início das atividades com turistas dependia também da capacidade de cada empreendimento em se preparar.

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